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Mostrando postagens de dezembro, 2010

OLHOS PARADOS cap.10

10 As lágrimas que rolaram aquele dia levaram um pouco do José Carlos menino e foram lavando a estrada para os passos de um outro José Carlos. D. Eunice e o Brito estranharam algum tempo aquelas mudanças nos hábitos do filho, mas depois acostumaram. Ele passava bastante tempo lendo. Às vezes, parava e ficava pensando... Outra vezes, escrevia com tanta vontade que parecia alguém com muita sede quando encontra água pura. As brincadeiras foram mudando, escasseando. Na escola ele arranjou outros amigos e amigas. O morro também começava a se modificar. As serestas foram diminuindo. As músicas foram mudando, sendo esquecidas. Bem-te-vi quase não aparecia mais, até que sumiu de vez e não se ouviu mais falar dele. Bem, mas ainda houve um domingo, à noite... Na cidade existia aquele programa de calouros na antiga rádio Difusora PRD3. A Hora do Galo. E naquele domingo o Bené foi lá participar. José Carlos e alguns outros foram para o campo, com um rádio de pilha para ouvir qual

OLHOS PARADOS cap. 9

9 Os olhos parados e a respiração suspensa do senador Brito Júnior pareciam ser a radiografia de todo o país. Havia um impasse. Mas se por um lado o trauma criara um compasso de espera, por outro começava a haver uma mobilização em nome daquelas questões que o Senador já vinha levantando em todo o território nacional. Agora que a sua ação inviabilizara-se, paradoxalmente cresciam os resultados, pois a mídia trazia a todo momento o seu ideário à baila. Tentaram por alguns momentos abafar o acontecido, mas já era tarde, a nação estava mobilizada. O episódio, no plenário do senado, fora forte demais e penetrara profundamente na alma da população. As manipulações subsequentes não conseguiram abafar as repercussões. O homem que tanto falara, quando se calou provocou com o silêncio a avalanche que suas ideias refletiram nos ecos da multidão. As imediações do hospital onde foi internado era o ponto de encontro dos vários grupos que chegavam de todos os lados. Improvisavam-se comícios, pa

Praia do Flamengo, 132: pedra fundamental!

Praia do Flamengo, 132: pedra fundamental! Sylvio Costa Filho (Ator e Professor) Foi nos anos 70, quando eu desci do ônibus naquele endereço e olhei lá para a porta e para a sacada, ao ver aqueles rostos e aquele prédio, o meu coração bateu mais forte. Escola de Teatro no 2º andar, Conservatório de Música no 1º andar. O nosso velho prédio: a sede da Une que foi incendiada e que ainda possuía as marcas da repressão da ditadura. Lá, no palco, que nós chamávamos de “palcão” ainda havia os vestígios do que ocorrera. Lá, eu passei muitos dos melhores dias da minha vida, as aulas da faculdade de Teatro, com os mestres: Bárbara Heliodora, José Renato, Henrique Oscar, Pernambuco de Oliveira, Yan Michalski, Amir Hadad, Ausônia, Glorinha Beutenmuller e tantos outros; a convivência com os amigos, o diretório acadêmico, o bar “Cabanas” lá embaixo, a efervescência de nossa jovialidade e resistência aos anos de chumbo... Além da arte, o que nos unia também era o amor por aquele prédi

Socorro sem água

Socorro, Socorro sem água, com fome. Socorro e seus baldes indo e voltando. Socorro e seus filhos andando e cansando. Açudes distantes pequenos barreiros caminhos custosos na trilha da sede. Socorro e as vizinhas em lágrimas secas. Nos sujos barreiros pessoas e bichos na guerra da vida. Na trilha dos medos faltando farinha sobrando miséria.