Crônica de uma manhã nebulosa
Ontem,
13 de dezembro de 20016, nos fez lembrar outro 13 de dezembro, em 1968, o dia
do AI-5, que nos tirou todos os direitos constitucionais e nos lançou em um
inferno de autoritarismo. E agora, a PEC 55, ou seja lá o número que queiram
dar a mais essa violência... Hoje
amanheceu nebuloso, chuvoso e triste. Em meu caso, amanheceu definitivo. Não
vejo mais solução para este país. Após mais de 60 anos em nome de ideais, de
esperanças, de lutas, ouso afirmar que não vejo mais possibilidades e peço
desculpas àqueles com quem briguei tantas vezes defendendo um Brasil justo e
democrático, como se isso fosse possível.
Ontem
mesmo, passei pela cidade e vi jovens largados pelas calçadas, bebendo e rindo
como se nada estivesse acontecendo, enquanto que suas vidas estavam sendo
comprometidas pelos próximos vinte anos. Vi o povo não entendendo absolutamente
o que se passava e achando estranho o movimento dos poucos que, em minha cidade
conservadora e, às vezes, até reacionária, pediam a destituição daqueles que
ilegitimamente tomaram o país de assalto. Esse mesmo e sofrido povo, se
aglomerando e se ajeitando como pode nas filas de ônibus de terminais imundos e
desumanos não entende que agora alguns queiram destituir outro presidente. “Ué,
mas querem tirar esse também, aí não vai ter mais presidente!?” – assim
comentava a senhora enquanto esperava o ônibus. Ela também não sabe o que lhe
espera nos próximos anos e não tem nenhuma ideia do que acabara de ser votado
contra ela e os seus familiares e amigos. E eu e a minha companheira não
tivemos mais ânimo para nos juntarmos ao pequeno bloco dos que protestavam. A
vida pesou em nossos ombros e um instante de amarga lucidez e cansaço paralisou
nossos gestos.
Hoje
acordei e olhei para a minha vida, as contas para pagar e a constatação de que
após tantos anos de trabalho dedicados à educação e à cultura não me deram nem
a possibilidade de suprir as minhas necessidades básicas. 3 anos sem um
reajuste salarial e agora com salários atrasados e defasados, tendo o 13º
salário como quase uma utopia, constato que não tenho mais condições de arcar
com minhas contas e permanecer com o plano de saúde. O que fazer? É o que me
pergunto, por trás do vidro da janela que olha para a névoa da manhã, de todas
as manhãs desta vida...
Enquanto
isso, os que dizem salvar a economia do país, recebem altos salários, promovem
banquetes milionários e violentam a nação com uma recessão de 20 anos. Não se
importam se a Organização das Nações Unidas se manifestou através de
autoridades ligadas aos direitos humanos que afirmaram o grande retrocesso que
essas medidas representam. Os que faliram o Estado e que deixam servidores sem
pagamento e na penúria são os mesmos que enriqueceram mais ainda os já
privilegiados, através de isenções fiscais milionárias e oportunistas. Os
poderes estão completamente corrompidos, as instituições apodrecidas e
corroídas. Presidente da câmara, do senado e da república delatados por crimes
envolvendo quantias inimagináveis para nós que lutamos para conseguir
sobreviver. E são esses mesmos delinquentes que legislam e governam o país
contra a maioria e a favor dos que ainda não abandonaram a mentalidade
escravocrata.
E
alguns de nós, da minha geração, nos olhamos, após tanto tempo e tanta luta, e
repetimos uns para os outros: “Nunca pensei que retrocedêssemos a esse
ponto!!!”
Desculpem,
mas houve um corte na luz do fim do túnel, talvez por falta de pagamento. E meu
otimismo ficou perdido nesta manhã nebulosa. Abraços fraternos aos companheiros...
Sylvio
Costa Filho
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