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Mostrando postagens de novembro, 2018

Diário do escritor que não fui - 30 de novembro de 2018

E foi-se novembro! Um ano triste, quase trágico. Há 5 meses não recebemos pelo nosso trabalho de teatro. As turmas que chegam agora para o ensino médio estão assustadoramente infantilizadas. Sem conhecimentos básicos, e o pior, não têm nenhuma vontade de aprender. O país escolheu uma figura patética para ser o presidente. E fez sua campanha toda calcada em afirmações e promessas fascistas. Uma campanha de ódio. Os ministros que ele está indicando para o seu "governo" configuram um quadro decepcionante. É lamentável ver o que se delineia para os próximos anos. Mais um governador do Estado do Rio foi preso esta semana. O anterior já estava preso. E aqui em nossa cidade o quadro é de um total abandono e descaso. A incompetência impera. Há dois dias atrás fomos à festa em comemoração aos 80 anos de Leonardo Boff. Lá foi um oásis, nesse deserto de ignorância e insensatez em que vivemos. Leonardo, o mestre, é um farol nessas trevas, e muitas pessoas que compareceram para abraçar o

Diário do escritor que não fui - 12 de novembro de 2018

O jovem sentou ao meu lado e, mais que depressa, sacou o celular, baixou a cabeça, "ciscando" sem parar e sem olhos para mais nada. Ao lado dele, outra jovem fazia a mesma coisa e ao lado dela, um homem de meia idade também olhava fixo a telinha do celular. Estamos na fila do ônibus. 12h50m. À nossa frente, do outro lado, um idoso, sentado no banco, frente ao parquinho, permanece, já há minutos, voltado para o celular. Para todos os locais, em todos os pontos, a mesma cena. As expressões semelhantes. A mesma alienação de tudo o mais. Estou voltando do trabalho. Hoje foram seis aulas lutando contra o vício dos alunos por seus joguinhos e suas conversinhas virtuais. Em um dos intervalos, encontrei no corredor um ex-aluno que me disse ter abolido da sua vida todas as redes sociais. Afirmou que estava se sentindo aliviado, como nunca. Mais leve! Verdade, sua expressão estava tranquila, sua humanidade voltara. Ele também disse que estava lendo mais. Livrara-se das algemas, desentr

Diário do escritor que não fui - 10 de novembro -

Abro uma página nesta tarde de sábado. Um sol tímido ameaça se espalhar, mas as nuvens insistentes não permitem. E o vento nos lembra das chuvas que povoaram todos os dias da semana. Iam e voltavam. O sino de vento não para na pequena sacada. Há dois dias atrás fomos assistir a uma leitura de um premiado escritor alemão na Casa de Stefan Zweig, hoje um museu que promove eventos dedicados à paz, à democracia e ao respeito às diversidades. Foi ali que Zweig, o grande escritor e biógrafo e sua secretária e companheira Lotte passaram seus últimos dias até o suicídio de ambos, na mesma casa, juntos, um ao lado do outro, na cama do casal. A ideia do museu e da preservação da memória foi uma iniciativa do jornalista Alberto Dines que escreveu um livro maravilhoso sobre o duplo suicídio, "Morte no Paraíso". Dines faleceu neste ano, de 2018, em São Paulo, no dia 22 de maio, no Hospital Albert Einstein. Voltei a ler alguns textos de Zweig. Aqui, nós, mais do que nunca, pelas atuais ci

Diário do escritor que não fui - 5 de novembro - continuação

Bem, volto aqui, para falar um pouco de como foi nascendo o escritor que não fui. Já andei perscrutando lá os primórdios, quando aprendi a ler e escrever e fui tomando gosto pela coisa. Depois vieram as leituras no colégio. Os primeiros livros que ganhei de presente. A biblioteca pública, como já falara, e as redações para as aulas de linguagem, como se falava antigamente. Comecei a gostar muito dessa parte. E as professoras das primeiras séries, parece que também gostavam da minha forma de escrever e, por essa razão, incentivavam-me e davam algumas indicações, que, à época, foram bastante positivas. Eu não permitia que ninguém se intrometesse com sugestões a respeito da forma ou das palavras. Fazia questão que tudo fosse feito por mim, porque, afinal de contas, a ideia era minha e ela vinha revestida de palavras que só eu mesmo poderia dizer. Caso contrário não seria a minha ideia e portanto não seria a minha redação. Era assim que o eu-menino pensava e agia. Certa vez uma professora

PoeManifesto: Muito além da Casa-Grande

Diário do escritor que não fui - 5 de novembro - dia da Cultura Brasileira

Uma chuva fina ainda continua pelo início da tarde de segunda-feira. Hoje, dia da Cultura Brasileira, algumas pessoas promovem eventos chamando-os de resistência. Muito mais do que resistir, a nossa cultura é questão de sobrevivência. É a nossa respiração, o compasso de nosso batimento cardíaco. Nas redes sociais eu publico um PoeManifesto que fiz, após minha conversa de sexta-feira com o professor Luiz Gonzaga. Aqui vou colocá-lo em homenagem ao amigo inspirador e ao dia em que comemoramos a nossa cultura. PoeManifesto: Muito além da Casa-Grande (Para  Luiz Gonzaga Souza Lima ) Ouço um batuque ribombando ao longe um apito um riso um tamborim e um pandeiro. E das nuvens que se dissipam em luzes levantando sacudindo a poeira dando a volta por cima por baixo por todos os lados em rodas danças sapateados vejo minha gente brasileira solta leve lépida e brincante tomando as canoas os rios e as ruas gargalhando coreografias entoando loas aos santos orixás quimbundos bantos aos plurais e

Diário do escritor que não fui - 4 de novembro

Fim de domingo. A chuva fina, do outro lado da janela, molha o jardim que já está quase todo imerso em escuridão. Passou o dia de Todos os Santos, passou o dia de finados e amanhã, cedo, voltarei às aulas. Sexta-feira, dia 2, fomos nos encontrar com Luiz Gonzaga. Grande amigo, um mestre, que tanto eu quanto Pita admiramos muito. Ele é um pensador do nosso Brasil e da nossa cultura como poucos, e é um privilégio poder compartilhar com ele alguns momentos. Sempre nos presenteia com palavras sábias sobre a constituição deste nosso país e as peculiaridades de nosso povo e sua formação. Em um momento tão temerário quanto este que estamos vivendo foi um alento ouvir as palavras dele. Dessa vez também nos contou um pouco da sua história de militância, de sua prisão, da violência que sofreu e de seu posterior exílio. Isso na época da ditadura. Depois contou-nos sobre sua vida fora do Brasil e seu trabalho como mestre na Itália. Saí com a certeza de que mais do que nunca teríamos que trabalhar